VÁ TRABALHAR, VADIO !
Por Rogério S. Farias
O poeta saiu de casa
Quando a lua paria os sonhos,
Parecia um sonâmbulo
Na noite em que se perdeu.
Ele achava tudo uma merda, uma prisão,
Mas mesmo assim
Viver lhe parecia uma belezinha efêmera.
Na rua, como um vira-lata,
O poeta ladrou
Para a lua e esta lhe respondeu
Com um carinho de luz.
O poeta estava mais para gato vadio
Do que para cachorro de rua.
Os olhos do poeta captaram
A mensagem maligna
Do Dragão Selenita
Que era uma mensagem de ódio
Para a humanidade perdida.
O poeta começou a ladrar mais alto.
Um polícia lhe abordou,
Pediu documentos ao poeta
E o poeta não os tinha,
Mas apresentou-lhe uns versos
Escritos com caneta azul
Num guardanapo sebento.
O poeta foi preso por atentado violento ao pudor
Ao mesmo tempo em que o tira lhe gritava:
Vá trabalhar, vadio!
O poeta irritou-se por tamanha injustiça
Porque trabalhava duro no seus versos
Sem ganhar um tostão.
E o coitado do policial, que ganhava pouco, estressou-se
E acabou atirando no frenesi de sua bravata.
Um cadáver estirado na rua,
Parecia um manequim descabelado e pálido.
E o outro policial murmurou
Como uma velha:
Fizeste merda, parceiro!
Um defunto desceu à cova,
Um espírito voou sem asas.
Um último verso no epitáfio:
Foda-se, isto tudo no mundo está uma bosta!
O corpo louco do poeta saíra de uma cadeia
E fora parar noutra, seu túmulo.
Mas alguma coisa como um vapor de luz
Fugiu do seu cadáver trancafiado na sepultura.
Era uma centelha, uma luz dançarina,
Algo como um fogo invencível para iluminar a Eternidade.
O poeta tinha morrido, seu corpo já apodrecia...
Mas a lua, lá no alto, lhe sorriu,
Voluptuosa como uma marafona boa,
Porque sabia que o poeta havia conseguido
Uma liberdade que só se consegue quando
Se termina um poema.